Adaptação do protocolo criptográfico Chaum
ao sistema eleitoral brasileiro
Publicado no Observatório da Imprensa em 2/11/04
Prof. Pedro Antonio Dourado de Rezende
Departamento de Ciência da Computação
Universidade de Brasília
1 de Novembro de 2004
4.3- Adaptação do protocolo criptográfico Chaum ao sistema eleitoral brasileiro
Enquanto adeptos do santo byte tentavam revogar a lei eleitoral que impunha a medida fiscalizatória por voto impresso que possibilitava recontagem, eu e outros pesquisadores da segurança computacional, incluindo o cientista
David Chaum, um dos mais profícuos e renomados
criptógrafos em atividade no mundo, começamos a trabalhar numa
adaptação do seu protocolo criptográfico para
eleições eletrônicas plenamente auditáveis
ao sistema brasileiro.
Um mês depois de revogada a dita medida, que entraria em vigor em 2004, participei com o dr. Chaum ,
em novembro de 2003, da apresentação de um protótipo desta adaptação no V
Simpósio de Segurança em Informática (SSI) no ITA, instituição em que se formou o missivista, e evento ao qual ele estava presente. Através do uso inteligente da criptografia, essa adaptação elimina todos os inconvenientes e riscos alegados para a revogação da medida fiscalizatória do voto impresso como regulada pela Lei 10.408/02, enquanto melhora a função de auditoria que deveria desempenhar.
Pela forma da Lei 10.408/02, uma impressora acoplada à urna insere numa sacola de
plástico lacrada o registro impresso do voto, após o
eleitor conferi-lo por trás de um vidro no percurso lacrado entre a impressora e a sacola. Na
adaptação do protocolo de Chaum, o registro é
apagado em parte, na metade que o eleitor escolhe ao confirmar, e
entregue como comprovante ao eleitor, para permiti-lo rastrear seu voto
na apuração, sem no entanto permiti-lo mostrar a outrem
em quem teria votado, impedindo a venda de votos. Sem sacola, sem
problemas e riscos que todos sabem infestar sacolas com de votos de
papel.
No protótipo mostrado no V SSI, o registro que codifica um voto ainda por confirmar é mostrado na primeira imagem abaixo .
O número do candidato escolhido para um cargo é marcado pela seleção dos respectivos algarismos, nas linhas correspondentes. O algarismo selecionando é representado por símbolos
distintos nas duas subcolunas, enquanto os outros na mesma linha
são representados por símbolos iguais. Na imagem abaixo o
eleitor veria, ainda sob o visor da impressora, que seu voto para
Deputado Federal estaria sendo registrado para o candidato 51.236,
o voto para Governador para o candidato 72, e o voto para Presidente ao
candidato 38.
Ao confirmar o voto, o eleitor teria que escolher qual subcoluna apagar, se a da direita ou a da esquerda. A segunda imagem mostra a escolha da direita. Ao confirmar sua escolha, a impressora
recolhe de volta o registro às claras, apaga a coluna escolhida cobrindo-a de tinta,
e entrega o registro com o respectivo comprovante impresso, conforme
mostrado no exemplo da imagem abaixo. A escolha pelo eleitor, ao confirmar o voto, de qual metade do registro será apagada, dentre duas metades aleatoriamente codificadas, serve como garantia matemática de que nenhum programa embusteiro eventualmente inserido na urna, ou no processo de apuração, teria
condições de saber, com antecedência, de que maneira aquele
voto poderia ser alterado de forma indetectável, entre o registro e a totalização.
A apuração procede com a versão eletrônica
cifrada da metade não apagada do registro, tendo como chave a
escolha aleatória da codificação. Esta
versão seria o seu o
voto eletrônico encriptado, impresso como sopinha de letras no
rodapé do comprovante, e listado eletronicamente na
"apuração" da
sessão eleitoral em que votou. Comparando a sopinha e a
listagem, o eleitor pode confirmar que seu voto está na fila da
totalização. Na totalização,
feita às claras, os votos encriptados
são decodificados em etapas, enquanto vão sendo
embaralhados, permitindo a detecção estatística de
manipulação indevida. Ao final, todos vêem a lista
dos votos às claras, mas sem chances práticas de
rastrear votos à origem.
Com a lista dos votos irrastreáveis às claras, a totalização pode proceder de
forma aberta e transparente, resguardada a integridade da lista. Esta
adaptação foi explicada pelo próprio Chaum ao técnico
Sr. Oswaldo Catsumi do TSE em um seminário técnico ocorrido na
Unicamp, antes do V SSI, quando o técnico do TSE prometeu "estudar a
proposta". Ao que me consta, continua estudando.