Jornal do Voto-E

Recorte do     Cadernos do Terceiro Mundo n° 221
Rio de janeiro, Junho/Julho de 2000

Minas debate o voto eletrônico
Oswaldo Maneschy
[Página original]

Assembléia Legislativa promove seminário,
reunindo representantes do TSE e críticos do sistema

A Assembléia Legislativa de Minas gerais promoveu, no dia 30 de junho, uma jornada inteira de debates sobre o sistema de votação eletrônica, que vem sendo implantado pelo Tribunal Superior Eleitoral desde o pleito de 1996 e que este ano será, pela primeira vez no país e no mundo, utilizado em todas as etapas do processo eleitoral.

Dos debates, participaram os expositores Paulo César Bhering Camarão, pelo TSE; Elizabeth Rezende, pelo TRE/Minas; Evandro Oliveira, pela Empresa de Informática e Informação de Belo Horizonte (Prodabel); e os debatedores Moacir Casagrande, assessor técnico do PT junto ao TSE; Amílcar Brunazo Filho, pelo Fórum do Voto Eletrônico, e Márcio Coelho Teixeira, também pelo fórum, especialista em software básico.

Participaram ainda dos debates Paulo Nakaya, Oswaldo Catsumi e Antonio Ézio, consultores do TSE; Marcos Lalo, representante da Procomp, empresa de computação envolvida na programação eleitoral; Frederico Gregório, representante da Microbase, outra empresa incluída no processamento eletrônico; Newton Almeida, assessor de planejamento do TSE, e Cláudio Rego, perito judicial em informática. Numa iniciativa de alta significação informativa, a sessão foi integralmente transmitida ao vivo pela TV Assembléia, que entra aberta no canal 40 e, fechada, no canal 11, permitindo-se também a participação do público.

Controlar o processo

O deputado Rogério Correia (PT-MG) fez breve exposição sobre os motivos que o levaram a montar e a coordenar o debate, com o apoio do presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, deputado Ermano Batista. Argumentou que "a adoção da urna eletrônica suscita pelo menos duas grandes questões: será o direito do voto exercido pelo eleitor ou pela máquina? E, em segundo lugar, como pode o eleitor fiscalizar a observância do seu voto?"

Rogério Correia explicou que o controle do processo hoje está nas mãos de uns poucos especialistas. Questionou se essa exclusividade de manuseio não poderia levar a fraudes. "São aspectos que evidenciam a vulnerabilidade do voto pela via eletrônica e que precisam ser esclarecidos, tendo em vista as próximas eleições municipais". Destacou também que esta era a razão de promover a discussão sobre a segurança do voto eletrônico.

O deputado destacou, ainda, que "as fraudes eleitorais sempre ocorreram no cenário político de nosso país. O voto de cabresto, a troca de voto nas urnas, a adulteração dos votos antes de serem contados constituíam algumas dessas fraudes. Com o avanço tecnológico, chegamos às urnas eletrônicas, mas não à eliminação das fraudes. Surgiu um novo tipo de delito - o desvio de votos mediante a alteração nos sistemas de informática. O assunto é certamente delicado, já que se comprova que os recursos eletrônicos são falíveis."

Rogério Correia lembrou que, para resolver o problema, muitas propostas estão surgindo, como o projeto de lei nO 194/99, em tramitação no Congresso Nacional, de iniciativa do senador Roberto Requião. Entre outras providências, o projeto recomenda a emissão, pela urna, do voto impresso, confirmando a escolha do eleitor. "O fato é que devemos evitar que as vantagens da urna eletrônica, entre elas a rapidez da apuração, sejam anuladas por ilegitimidades que representem retrocesso para a evolução democrática", frisou o parlamentar mineiro.

TSE: urna à prova de fraude

O primeiro expositor da sessão foi Paulo César Camarão, responsável pelo setor de informática do TSE. Camarão disse, entre outras coisas, que a principal premissa da implantação do voto eletrônico no Brasil, definida em 1995 pelo então presidente do TSE, Carlos Veloso, foi o de acabar com as fraudes eleitorais no Brasil. Frisou que a Justiça Eleitoral trabalha integralmente voltada para o respeito à vontade do povo - possibilitando a eleição dos representantes legitimamente eleitos. O representante do TSE garantiu que "a urna eletrônica foi construída com toda a seriedade". Manifestou também a intenção de mostrar, em todos os detalhes, como a urna funciona, o que foi explicado pelo assessor Paulo Nakaya, que acompanha o projeto de informatização do voto desde o início dos trabalhos, em 1995. Primeiro, Nakaya relatou que a urna de 1996 era uma, a de 1998, outra e, agora, em 2000, "as urnas receberam novos aperfeiçoamentos técnicos".

Segundo Nakaya, a urna é lacrada e à prova de invasão externa, e que os programas também são totalmente garantidos. Frisou que não é possível preparar programas que viciem a eleição, porque o TSE não saberia quem são os candidatos - assim, não haveria como associar programas a candidatos, de modo a beneficiar uns e prejudicar outros. Garantiu: "Não adianta a Procomp tentar botar um código estranho no programa, porque não vai bater com o nosso."

Técnicos: incertezas concretas

A confiabilidade absoluta, atribuída pelos técnicos do TSE aos programas utilizados para os processos de votação e totalização, não é compartilhada pelos técnicos independentes que vêm, através do fórum do voto eletrônico, levantando pontos discutíveis da legislação e de sua prática.

Os representantes dessa corrente no debate contestaram a certeza demonstrada pelo TSE. Segundo Amílcar Brunazo Filho e Márcio Coelho Teixeira, tecnicamente é indefensável a certeza dos representantes do TSE. Ambos voltaram a destacar as possibilidades de manipulação do sistema (veja, a propósito, a matéria de capa da edição nē 219 de cadernos), e condenaram sobretudo a forma fechada pela qual o assunto é tratado, tolhendo a possibilidade de fiscalização por parte dos partidos políticos e qualquer tipo de comprovação que dê ao eleitor a certeza da correta destinação de seu pronunciamento.

A uma afirmação categórica por parte da equipe do TSE de que "o sistema de voto eletrônico implantado no país é 100% garantido e inviolável", Amílcar Brunazo pôde contrapor que seria extremamente categórico na afirmação contrária de que o sistema é 100% inseguro.

A polêmica, portanto, se mantém de pé, reforçada pelo fato de que os partidos pouco acesso têm à questão e nenhum se atreve a afirmar que possui a capacidade de exercer uma fiscalização adequada sobre o processo, como lhe garante a legislação e presume a democracia.

Ao Congresso cabe buscar um aperfeiçoamento do processo, como propõe o projeto do senador Roberto Requião.

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